28
dez
09

Twin – Capítulo 1

Ele estava trabalhando quando a campainha tocou. Achou estranho, não esperava ninguém. Não aquela hora da noite no sábado. Todos os seus amigos já tinham arranjado algo para fazer e ele já tinha recusado todos os compromissos, era dedicado com o trabalho e o prazo era curto. Demorou um pouco para salvar tudo e ir até a porta. Não pretendia demorar então nem se preocupou em vestir algo além das cuecas. O verão estava quente naqueles dias, mesmo durante a noite e ele não pretendia ser visto mais que o suficiente por quem quer que fosse.


Quando chegou à porta e olhou no olho mágico ele precisou olhar novamente para ter certeza. A lembrança dos tempos de Colegial voltaram como um raio para sua mente e ficou tão absorto que a campainha soou novamente. Acordado do mar de lembranças ele abriu a porta, não sabia que emoções esboçar, sua capacidade de fingir sentimentos foi desligada sem aviso e ele simplesmente ficou boquiaberto em frente a ela.

Ela estava com uma grande mochila nas costas, sem contar a bolsa, a grande mala de viagem aos pés e um rosto sério. Ela nunca imaginou que estaria nessa situação, não tão cedo. Tinha somente 25 anos e lugar nenhum para ir. Havia brigado com a mãe 3 horas atrás e estava resolvida a sair de casa e aquele era o único lugar que ela poderia ir.

Ele abriu a porta e só conseguiu dizer “Só um momento!” Abriu o trinco e a deixou entrar. Ficou atrás da porta pois não havia esquecido de suas vestimentas. Ela entrou e ele a olhou de cima a baixo. Havia mudado pouco, mas isso pouco lhe importava. Nunca se importou. Ela diz “Obrigado, eu não…” mas antes que ela se virasse ele chega bem perto dela, não para seduzi-la nem nada parecido, mas apenas para que ela não olhasse para ele. Ele a segura pelos braços e a virá de costas para a porta e sussurra “Só um momento…” novamente e atravessa a sala na outra direção para ir ao quarto colocar alguma roupa.

Ela começou a olhar toda a sala, entendeu o que havia ocorrido e deu uma risada breve, quase esquecendo dos problemas que faziam das malas um fardo muito mais pesado. Lembrou de como o jeito dele a agradava e fazia esquecer dos problemas. Quando ele voltou ela virou para ele e, aos dois, essa foi a troca de olhares provavelmente mais longa de suas vidas. Desde quando se separam no colegial não admitiam sentir saudade um do outro. De fato, depois de 2 anos já não trocavam mais e-mails. Ambos sempre ocupados com trabalho e estudo, quase não sobrava tempo para os amigos mais distantes.

Ele achou estranho que ela estivesse sorrindo quando virou-se e achou que fosse uma brincadeira de seus olhos e então perguntou “O que aconteceu?”. Estava visível e sinceramente preocupado. Nunca imaginou que ela (ou ele) estaria nessa situação. Percebeu que o rosto dela abaixou-se e uma tristeza a fez abraçar o próprio corpo. Percebeu então que a pergunta a lembrou do motivo de estar ali. Quase tropeçou na bolsa que estava no caminho quando foi em direção a ela, ela estava quase chorando quando ele a abraçou e sentaram-se no sofá ao lado.

Ela já tinha se esquecido de como o abraço dele era quente e macio, mas firme e seguro. Já haviam dito que seu abraço era assim, mas ela nunca foi do tipo de abraçar, ainda mais ele. Por um momento ela sentiu-se arrependida de não dar atenção a ele durante todo o tempo que estiveram juntos no colegial. Ele sempre esteve ao seu lado e, por mais que ela não admitisse, ele tinha um carinho especial por ela. Provavelmente era a pessoa que melhor a conhecia, apesar de sua fachada sempre firme e as vezes solitária.

Ele estava confuso, imaginou que aquele abraço nunca iria ocorrer em sua vida, apesar de negar que o esperava. O tempo conseguiu fazê-lo esquecer daquela espera mas naquele dia tudo voltou e ele só conseguia acariciar seus cabelos negros enquanto a ouvia chorar baixinho em seu colo. Pela janela conseguiu enxergar a chuva cair discreta, sem nem mesmo molhar a janela. Ele acharia divertido a poética da chuva em aparecer naquele momento se não soubesse que aquilo seria um grande balanço em sua vida.

Ela não sabia porque estava chorando, porque ali, naquele momento e na presença dele ela estaria triste pela situação. Sempre quis sair de casa. Já não aguentava conviver com os pais, brigava toda semana e as discussões ficavam cada vez mais pesadas. Naquela noite decidiu ir pra nunca mais voltar. Estava tão decidida e nervosa que não sabia nem mesmo para onde ir. No ponto de ônibus que ela começou a pensar pra onde ia, mas pegou o primeiro que apareceu. Só depois de muito andar que ela conseguiu pensar para onde ir. Na verdade pensava em para quem ir. Não sabia porque pensava nele, mas sabia que com ele estaria segura. Lembrava que um dia conversaram vagamente sobre seu apartamento novo. Ela (muito menos ele) sem lembrava dessa conversa, foi realmente breve e ele quase não pôde dar atenção a ela. Depois de decidir o caminho só se lembrava de sair de casa e de estar lá, na porta dele. Agora estava soluçando quieta ainda no colo dele. Não queria conversar, só queria dormir e ele entendeu muito bem. A unica coisa que ele disse foi “Vou arrumar a cama para você” e nada mais. Naquela hora ela não precisava de nada mais.

A cama tinha o aroma dele, o mesmo que estava em seu colo e ela conseguiu dormir. Estava cansada e a noite passou como uma brisa de vento momentânea, que você sabe que esteve ali mas não consegue se lembrar de como era.
Ele não conseguiu dormir.


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